Premiado pela Funarte, projeto prepara vídeo de dança para assistir de olhos fechados

O projeto Só se fechar os olhos, do Coletivo Desvio Padrão, de São Paulo, foi um dos contemplados no Prêmio Festival Funarte Acessibilidança Virtual 2020 e prepara o vídeo do espetáculo para exibição ao público. Inédito na instituição, o edital tem foco na acessibilidade e inclusão e abrange as cinco regiões do Brasil. A sessão foi filmada na Sala Carlos Miranda do Complexo Cultural Funarte SP e será disponibilizada em breve, em canal a ser divulgado. A apresentação paulista convida o espectador a fechar os olhos, literalmente, e apreciar a dança a partir da narração, dos sons e da música, criando suas próprias imagens.

 

Com texto de Edgar Jacques, ator e dramaturgo cego desde a infância, a montagem oferece uma inversão da lógica da audiodescrição. Como Jacques nunca assistiu a um espetáculo de dança, a própria imaginação e criatividade dele foram os limites para a criação. Enquanto a audiodescrição consiste em traduzir o mundo visual em palavras, permitindo que pessoas cegas e com baixa visão possam compreender a dimensão visual, o projeto chama o público para apreciar uma obra a partir da perspectiva de quem não enxerga.

 

A intenção é que o espectador, seja porque é cego ou porque aceitou fechar os olhos, cocrie a dança em sua mente tendo o audiodescritor como guia. “Além de nossas formulações em palavras, sons e ritmos — coisas exteriores — Só se fechar os olhos é uma dança criada com trechos de memória, lembranças, sensações, intensidades e formulações interiores das pessoas que aceitam a experiência”, explica o Coletivo. Maria Fernanda Carmo e Mariana Farcetta assinam a concepção e performance.

 

De acordo com a sinopse, duas rainhas, “opostas, mas complementares, descobrem movimentos possíveis para além da norma”. “Se o espectador fechar os olhos e abrir os ouvidos, ele as vê. E elas dançam”, acrescenta o texto. Trata-se, continua o resumo da obra, de uma “experiência sinestésica” — ou seja, de associações psicológicas de sensações de caráter distinto, por exemplo, de um som e uma cor —, como resultado da cooperação entre a mente de quem assiste e do fluxo da coreografia.

 

“Nosso combinado com o público é o seguinte: escolha um lugar confortável, tente relaxar e desligar dessa roda-viva de imagens, telas e luzes em que nos metemos. Então feche os olhos e procure habitar o tempo de uma dança que só existe como sensação, imaginário e fluxo. As imagens vão começar a se formar na mente daqueles que aceitaram embarcar nessa experiência e, durante esse fluxo, poderemos nos impressionar com as possibilidades da nossa própria capacidade onírico-pensadora”, completa o grupo.

 

O Coletivo produz versões audiovisuais do espetáculo. Uma delas é em português com o texto narrado e performado por Maria Fernanda Carmo e Mariana Farcetta, com trilha sonora original executada por Enrique Menezes (composição e viola caipira) e Rafael Ramalhoso (violoncelo). A outra é em Libras, apresentada pelas atrizes e performers surdas Nayara Silva e Catharine Moreira.

 

Acessibilidade


Com classificação livre, os vídeos terão audiodescrição — notas com informações sobre o espetáculo, como sinopse, concepção e ficha técnica, bem como a descrição do espaço físico, dos artistas e figurinos; a transcrição do texto para Libras com interpretação por Catharine Moreira e Nayara Silva; e legendas para surdos e ensurdecidos (LSE).

 

O projeto oferece um plano de divulgação para garantir acessibilidade aos diversos públicos-alvo, com produção de flyers e posts audiodescritos, convites sonoros, convites em Libras e LSE; e divulgação dos materiais produzidos nas redes e grupos de pessoas surdas, cegas e com baixa visão, com deficiência intelectual, autismo, dislexia e mobilidade reduzida.

 

O Prêmio Festival Funarte Acessibilidança Virtual 2020 anunciou em novembro a premiação de 25 propostas, destinando R$ 31,2 mil a cada uma, em um total de R$ 810 mil em investimentos, sendo R$ 30 mil reservados a custos administrativos. O objetivo é valorizar e fortalecer a expressão da dança brasileira e possibilitar a sua democratização, inclusão e acessibilidade.

 

© Thamires Mulatinho / Divulgação