Leia crônicas sobre a vida policial escritas pelos seus próprios integrantes

Em homenagem ao Dia do Policial Civil, comemorado no dia 29 de Setembro, foi realizado concurso de seleção de crônicas sobre a vida policial. Houve uma seleção e as escolhidas poderão ser conferidas nesta editoria de arte e cultura do zerouminforma.com.br  (logo depois da matéria)

 

O projeto desenvolvido pela Assessoria de Gestão de Processo e Planejamento tinha como finalidade conhecermos melhor os policiais civis de nossa Instituição e aprendermos quais as experiências que mais lhe modificaram a vida.

 

A comissão escolhida (Delegado Geral, Delegado Geral Adjunto, DPI, DPE, DPE, DIP, Corregedoria, Acadepol, Sinpol e Adepol) para selecionar as melhores crônicas não teve uma missão fácil, haja vista a participação de tantos policiais, porém, após muita deliberação, as escolhidas foram:

 

Esmeralda – 7 votos – do Delegado de Polícia Ricardo Meirelles;

 

O Sonho de um Menino – 7 votos – do Investigador de Polícia Samuel Barbosa Menacho;

 

Plantão Policial – 6 votos – do Escrivão de Polícia Fernando Sérgio Gonçalez.

 

 

Os autores das crônicas serão homenageados no dia 18 de Outubro de 2017, durante reunião do Conselho Superior da Polícia Civil

 

A Polícia Civil destacou a importância deste projeto, pois é necessário que a comunidade tenha conhecimento dos problemas da Instituição e os dilemas diários enfrentados pelos trabalhadores policiais, a fim de que possam passar a se interessar pelo verdadeiro trabalho policial – que é diferente daquele representado em programas de televisão e novelas. Uma vez que, desejamos uma aproximação baseada no respeito e consideração, quebrando o distanciamento e buscando o conhecimento das necessidades tanto dos policiais como da sociedade.

 

Delegado Geral da Policia Civil Dr. Marcelo Vargas Lopes, parabeniza todos os policiais que participaram do projeto e contaram um pouco das suas historias, acredita que assim a Policia Civil fortalecera o seu vinculo com a sociedade.

 

Os selecionados receberão um prêmio simbólico no dia 18/10 às 09h em sessão solene do CSPC, com a presença também dos representantes da Adepol e Sinpol, além de terem suas crônicas publicadas no site da Policia Civil.

 

ESMERALDA

 

Tantos casos acontecem no dia a dia de uma Delegacia de Polícia, tantas pessoas vem e vão e de alguma forma suas histórias, seus anseios, suas aflições, nos marcam de uma maneira que muitas vezes vivemos, mesmo que por alguns momentos, a vida de quem nós servimos e protegemos.

 

E não é este o lema estampado no brasão de nossa polícia civil do MS e que honramos com nosso profissionalismo, nosso trabalho, a dedicação e o companheirismo, num ritmo de superação de todo o policial.

 

Em meio a nossa rotina, me lembro de minha saudosa primeira lotação na Delegacia de Itaporã, embargado de técnicas e teorias jurídicas e policiais. Neste clima de pioneirismo na profissão atendi uma senhora já idosa, mas que os anos não apagaram a ternura em seu olhar. E que olhar…olhos verdes tão lindos que me remeteram ao tempo de infância com minha querida avó, cujos olhos tão autênticos lhe deram o nome de Esmeralda, que em homenagem contemplei minha querida filha.

 

Mas voltemos àquela senhora dos olhos verdes, cabelos brancos que lembravam nuvens de algodão e que ao ser atendida pelos investigadores disse estar sendo perseguida por bandidos. Isso mesmo, bandidos!!! Ao saber do fato me revoltei com aquela situação, fomos ao local, investigamos, demos toda a assistência porém os “malfeitores” não localizamos.

 

Novamente aquela doce senhora, entre seus oitenta e poucos anos de vida, retornou a Delegacia. Fiquei intrigado com a situação e novamente a levei em minha sala na busca de resolver seu problema, ou talvez o meu próprio dilema de reviver minha infância.

 

Aos poucos percebi que os “homens” que a ameaçavam, cujos nomes, endereços, com tanta riquezas de detalhes ela me descrevia, estavam arraigados em sua imaginação. Talvez naquele ponto onde o tempo é cruel e não perdoa nem as mentes mais brilhantes, nos transformando, com sorte no fim dos dias, em crianças novamente.

 

Nessa toada já havia procurado a assistência social do Município, pedi para psicólogos locais a atenderam, assistentes sociais, parentes e amigos, mas nada resolvia nosso dilema. Aquela pobre senhora continuava sendo perseguida e eu já tinha me afeiçoado a ela. E em meio a nossas conversas ela me revelou:  “os bandidos colocaram um mendrive em minha cabeça, isso mesmo, “um mendrive”. O que seria isso pensei??

 

Foi nesta hora que ela me descreveu o que tinham feito, colocaram, não me perguntem como, um mendrive em sua cabeça e este objeto dizia todas aquelas coisas horríveis, desde xingamentos, ameaças de morte, estupro, furtos e roubos que aconteceriam com ela caso eu não fizesse algo.

 

Foi quando tive a ideia, pedi para um investigador pegar um velho rádio que havíamos apreendido e que estava parcialmente desmontado. Entre os pedaços do rádio e uma velha bateria, disse para aquela senhora que havíamos desenvolvido um aparelho que neutralizava o mendrive em sua cabeça. Informei que a tecnologia da polícia conseguiria destruir aquele aparelho e por fim as vozes dos “bandidos” que tanto a incomodavam.

 

Fizemos uma cena digna de Oscar, colocamos o aparelho na cabeça daquela senhora e após alguns rituais técnicos que confesso que deixamos a imaginação rolar, terminamos a sessão. Informei para ela após uma consulta no SIGO, que o procedimento tinha sido um sucesso, o aparelho estava desligado e ela não ouviria mais nada. Estava LIVRE dos MALFEITORES.

 

Muito feliz ela me agradeceu e despediu-se, admito que senti um misto de alegria por ajuda-la mas um quê de tristeza, por não poder desfrutar, ao vivo, das lembranças de minha avó. Alguns dias depois novamente estava aquela idosa na porta da Delegacia, mas desta vez para me agradecer e por mais algumas vezes lembro-me dos investigadores comentarem que a senhora do mendrive havia passado lá, para dizer que estava bem, que a máquina funcionou.

 

Meses e meses se passaram a vida seguiu seu rumo até que numa tarde de verão recebi uma mensagem da DEPAC/DOURADOS, onde o investigador me alertava sobre uma idosa que estava sendo ameaçada, obrigada a fazer várias coisas, que queriam assalta-la e tudo mais…e que ele – investigador – estava revoltado com a situação pois ela morava em Itaporã e precisava de ajuda.

 

Nesta hora me veio a lembrança, perguntei a ele como eram os olhos daquela idosa, dos majestosos cachos brancos. Foi então que ele me disse: – são verdes Delegado, como lindas Esmeraldas. Nesta hora, não sei se sorri por nostalgia, ou pela tragicomédia dessa vida, ou será que foi para disfarçar minha vontade de não dividir aquela história, ou por fim aquela senhora com outro “neto” que naquele plantão lhe sorria.

 

Ricardo Meirelles / Delegado de Policia Civil